Câmbio só vai mudar se juro baixar, avalia Dilma

Postado por Ricardo Schwalfemberg

A presidente Dilma Rousseff está convencida que não há como evitar a valorização do real frente ao dólar enquanto não houver condições de reduzir os juros internos, que atraem capitais estrangeiros em busca de ganhos de arbitragem, contribuindo para a apreciação da moeda nacional. Satisfeitas com os resultados da primeira etapa da visita da presidente Dilma Rousseff à China, concluída ontem em Pequim, as autoridades brasileiras já preparam para iniciar em maio uma segunda etapa de negociação com os chineses, que tratará das barreiras ao comércio e planos de investimento entre os países.

Valor Econômico – SP – 14/04/2011


Sergio Leo e Claudia Safatle | De Pequim e Brasília
14/04/2011

A presidente Dilma Rousseff está convencida que não há como evitar a valorização do real frente ao dólar enquanto não houver condições de reduzir os juros internos, que atraem capitais estrangeiros em busca de ganhos de arbitragem, contribuindo para a apreciação da moeda nacional.

Segundo disse o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, ao Valor, “a presidenta Dilma acha que enquanto não conseguir botar o juro para baixo não adianta tentar mexer no câmbio”. Pimentel é um dos auxiliares mais próximos da presidente, a quem acompanha em viagem à China. Dilma já havia dito, terça-feira, que espera trazer a taxa de juros a patamares equivalentes ao padrão internacional durante seu mandato, nos próximos quatro anos.

A questão cambial está na raiz de uma divergência na área econômica do governo entre os que insistem em segurar a taxa de câmbio no patamar de R$ 1,65, e outro grupo, que se mostra hegemônico nas últimas semanas, que advoga uma atitude mais serena do governo, de deixar o dólar se desvalorizar mais ao sabor do mercado e aceitar a ajuda do câmbio na batalha contra a inflação.

No primeiro time estariam o presidente do BNDES, Luciano Coutinho – que fez um desabafo recente, num encontro com empresários, contra a apreciação do real – Pimentel e o ministro da Fazenda, Guido Mantega. O ministro da Casa Civil, Antônio Palocci, seria o principal defensor da segunda hipótese, junto com o presidente do BC, Alexandre Tombini, em conformidade com a posição de economistas da Casa das Garças, que debateram esse tema em reuniões nas últimas semanas.

Dilma atribuiu a apreciação preocupante do real frente ao dólar, moeda que vem enfraquecendo sistematicamente no mercado internacional, às taxas de juro brasileiras e à política de afrouxamento monetário dos países desenvolvidos. Ontem, o dólar encerrou o dia cotado a R$ 1,591. Em dezembro, valia R$ 1,666.

Ela admitiu ver dificuldades no controle do câmbio, com os movimentos especulativos provocados pela grande liquidez existente no mundo. “Não é uma situação que resolvamos por decreto”, argumentou Dilma, assegurando que o governo está atento para adotar medidas para que o problema “não se torne maior do que já é”.

“Vamos continuar perseguindo (a estabilização da taxa de cambio”, mas sabemos que há toda uma série de mecanismos que leva a processos de bypass (burla dos controles) etc.”, disse ela, no único pronunciamento feito à imprensa durante a visita à China.

Para o empresário Daniel Feffer, vice-presidente da Suzano Holding, os sinais emitidos por Dilma são encorajadores para o investimento. “Gostei de ouvir que, em quatro anos, a presidente quer atingir juros competitivos”, disse. “Isso é coisa forte, importante, dá confiança ao empresariado”, explicou. “Implica ação planejada que, se for feita conjuntamente, tem mais chance de dar certo.”

Feffer reconhece que a atual taxa de câmbio “é um solavanco” para a competitividade da indústria. O modelo de economia escolhido pelo Brasil leva a esse resultado, diz. “Mas a presidente não é ingênua de dizer que pode baixar juros de pronto. Precisa de muita coisa, esperamos que consiga fazer.”

China e Brasil negociam de novo em maio
De Pequim
14/04/2011

Satisfeitas com os resultados da primeira etapa da visita da presidente Dilma Rousseff à China, concluída ontem em Pequim, as autoridades brasileiras já preparam para iniciar em maio uma segunda etapa de negociação com os chineses, que tratará das barreiras ao comércio e planos de investimento entre os países. Os chineses são mais objetivos que os Estados Unidos no tratamento das questões bilaterais, afirmou ao Valor o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel.

“Com o presidente [dos Estados Unidos, Barack] Obama, havia mais empatia, entendíamos o inglês, houve um clima afável”, comentou ele. “Na China compensam as dificuldades da tradução com um protocolo ultrasofisticado, mas o presidente [chinês] Hu Jintao teve uma objetividade que o Obama não teve”, comparou o ministro. “Com Obama houve empatia, mas não resultado; com Hu Jintao não se criou aquele clima familiar, mas teve resultado.”

A segunda fase de discussões com a China envolverá a ida ao Brasil de algumas das principais autoridades do país: o ministro do Comércio, Chen Demin, chefiará em maio uma missão comercial e a delegação chinesa na reunião da Comissão Econômica e Financeira Brasil-China. No segundo semestre, o Brasil receberá a visita do vice-primeiro ministro, Wang Quishang, que participará da Comissão de Alto Nível Brasil-China (Cosban). A reunião da Cosban vinha sendo adiada pelos chineses e é interpretada pelo governo brasileiro como compromisso da China em estreitar a relação com o Brasil e tentar eliminar atritos bilaterais. “Trataremos das questões como as tarifas contra produtos manufaturados brasileiros, investimentos brasileiros em siderúrgicas chinesas e outros temas pontuais”, disse ao Valor o ministro de Relações Exteriores, Antônio Patriota.

“Se examinarmos as questões que colocamos aos chineses, elas já produziram resultados, como a liberação de importação de carne suína e compra de aviões da Embraer”, citou Patriota, para justificar o otimismo do governo brasileiro, que obteve, na China, a promessa formal do presidente Hu Jintao de esforço para aumentar o valor agregado das importações de produtos brasileiros. “Na visita que fizemos em janeiro, eles disseram que fariam um esforço, e fizeram”, argumentou.

Nem tudo é harmonia, porém. A reunião de maio deverá servir também para discutir a crescente pressão dos empresários brasileiros contra produtos chineses, que já são objeto de nove pedidos de salvaguardas (sobretaxas e cotas) a serem analisados em breve pelo Ministério do Desenvolvimento.

Embora não tenha tratado diretamente das queixas da indústria siderúrgica brasileira sobre as dificuldades em investir na China, o governo chinês “entendeu o recado”, diz o ministro Pimentel, que também avalia como “muito bom” o resultado da visita. “A ideia básica da presidenta Dilma, com a qual eles concordaram, é que daqui pra frente o relacionamento tem de ter reciprocidade”, disse. “Significa que se não pode abrir siderúrgica aqui não pode abrir lá também não, por exemplo.”

Pimentel contou ao Valor que Hu Jintao “foi direto ao ponto” e tomou a inciativa de anunciar a decisão de compra de 35 aviões da Embraer assim que Dilma mencionou, de passagem, a Embraer como exemplo de cooperação entre os dois países. Os chineses vinham relutando em autorizar a compra de aviões da empresa e o uso, na construção de outro tipo de aeronave, da fábrica originalmente criada na China pela Embraer e pela chinesa Avic para fabricação do ultrapassado EMB 145. A fábrica foi autorizada a montar jatos executivos e Pimentel, otimista, crê que, em maio, os governos poderão falar em encomendas adicionais às anunciadas nesta semana.

“A Embraer vê demanda para até 80 aviões EMB 190; eles devem autorizar aos poucos”, espera o ministro. Ao reconhecer a demora dos chineses no atendimento dos pedidos brasileiros, Pimentel contou seu diálogo com o ministro Chen Demin, em reunião na terça-feira. ‘Vocês têm de entender que as coisas na China são demoradas’, alertou Demin. ‘Mas sua economia está crescendo bem rapidamente’, respondeu o brasileiro. ‘Estou falando de decisão, não de produção’, esclareceu o chinês.

O diálogo terminou em risos quando Pimentel presenteou Demin com a camisa da seleção brasileira, autografada pelo jogador Robinho. “Sabe o simbolismo da camisa? É para jogarmos no mesmo time”, disse Pimentel a Demin.

“No fundo, a competição da China, se soubermos trabalhar, não é ruim”, comentou o ministro. “Nos força a ficar mais competitivos, mais espertos, mais atentos à mudança tecnológica”, disse. (SL)

Valor Econômico – SP – 14/04/2011

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